A feira Intermodal e o Coronavírus

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Nuno Figueiredo

10 de mar de 2020

· 6 min de leitura

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feira Intermodal
Coronavírus
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No momento em que escrevo este post, há uma grande chance da Intermodal, a maior feira de transportes e logística do Brasil, deste ano ser cancelada. Até agora, dia 04/03, algumas empresas já anunciaram que não irão participar, incluindo patrocinadores como o armador Aliança-Hamburg-Sud. Além deste, a DB Schenker, a Kuehne-Nagel, a ALLINK e o grupo MSL já fizeram comunicados informando que não irão participar. Em todos os comunicados o motivo é a prevenção contra o Coronavírus.

Em 28 de Fevereiro a organização da Intermodal já havia publicado em seu site as providências que eles tomaram para diminuir os riscos. O comunicado informa que o número de visitantes estrangeiros corresponde a 5% dos visitantes. Também menciona que os expositores que viriam da China cancelaram a participação.

Temos no momento, 2 casos confirmados de infecção, ambos com situação clínica estável e promissora. Zero mortes até o momento. Isso é um exagero?

Parece que ainda estamos longe de uma calamidade. Uma calamidade deveria ser algo não previsível, portanto, inevitável. Faz parte da vida.

E um vírus? Especialistas no assunto convergem em dizer que desde 1918, com a famosa gripe espanhola, que a pergunta correta não é se vai ocorrer de novo, mas sim quando. E já tivemos várias epidemias que se tornaram globais, como a SARS, a gripe aviária, entre outras.

O fato é o quanto os governos e a sociedade civil estão prontos e preparados para lidar com ocorrências sérias de grande impacto.

E neste cenário, um mundo globalizado cobra o seu preço. Não basta um país desenvolvido ter meios eficientes de tratar e lidar com o assunto. Outros países subdesenvolvidos, que tem sérios problemas de saneamento básico e assistência médica, já estão sobrecarregados. Uma pandemia pode tornar a coisa toda um caos.

E isso basta para que qualquer doença se espalhe. O planeta é um só, não basta cuidar da sua cozinha, tem que que olhar pela casa como um todo.

E não teremos aqui uma questão de posição mais à esquerda ou à direita e sim algo muito pragmático: a segurança de um está fortemente acoplada à solução do todo. Erradicar doenças como a varíola foi algo importante para o mundo todo. Hoje o retorno de uma doença como essa provocaria grandes problemas em um sistema de saúde que não está mais acostumado a lidar com isso.

No ataque às torres gêmeas, especialistas avisavam que um ataque biológico seria muito mais destrutivo, e para isso não precisava inventar um novo supervírus, bastava usar algum que há muito tinha sido erradicado. Provocaria a mesma coisa que a varíola fez com os índios americanos.

O mundo não está preparado para lidar com uma epidemia global. O que se vê é reação a respeito de algo que já está ocorrendo. Até aqui tudo bem, mas se vier algo mais forte o efeito poderá ser devastador. E isso não será uma calamidade em si, mas falta de preparo adequado.

Recomendo muito que assistam este TED do Bill Gates, contando como foi a experiência de contenção do Ebola na África, este sim algo extremamente letal. O título do Ted é elucidativo: “A próxima epidemia? Não estamos preparados”.

Recomendo também este vídeo do Gan Kim Young. Ministro da saúde de Singapura, disponível no Youtube. Em resumo ele ensina que o Coronavírus é mais transmissível, mas menos letal que outros como a SARS. Importante a informação que a transmissão não ocorre pelo ar como numa gripe comum. É pelo toque, principalmente quando a sua mão infectada toca a sua cara. Duas dicas preciosas decorrem disso: lave bem as mãos constantemente (ou use álcool gel) e não use máscara, a menos que você esteja infectado.

Voltando para o cancelamento de participar da Intermodal, é ou não um exagero?

Bom, se o assunto é prevenção, temos que analisar o risco. O risco neste caso é algo mensurável. Temos duas variáveis para olhar: o número de pessoas infectadas na população e dentro das pessoas infectadas, o número de mortes, ou seja, a letalidade da doença. Aqui vamos para algo menos subjetivo, pura matemática.

Outra recomendação é este excelente artigo a respeito. Vou resumir o ponto principal. Esse artigo foi escrito em 28/02/20. Nesse momento havia 84 mil pessoas infectadas no mundo, ou um caso por mil. O Dr David Katz compara isso com o risco de você ser morto por um raio nos EUA, cujo risco é de 1 a cada 3000 pessoas. E isso é o risco de você ser infectado, dos infectados, o número de mortes é menor que 4%.

Isso posto em perspectiva com outros riscos que estamos sujeitos, desde outras doenças e vírus, até riscos de acidentes, põe o assunto em perspectiva, e nesse caso, há uma comoção mais forte do que a realidade indica como necessária.

A grande maioria da população não gosta de matemática, estatística, isso é tudo muito chato, mas sem olhar números, aí vira papo de futebol, cada um tem a sua opinião. Já escrevi a respeito disto por conta da gripe suína no posts: "Apenas números" e em seguida no post “Mais alguns números” em 2010.

No primeiro post acima mencionado tem uma parte que gostaria de repetir:

Interessante a forma como lidamos e analisamos alguns números. Nosso comportamento pode ser extremamente incoerente, face à realidade estatística que, friamente expõe que nem todas as nossas decisões se apoiam na lógica.

Há momentos em que o mínimo denominador comum se apresenta. Neste instante voltamos a condição mais básica e somos dominados pela parte reptiliana de nosso cérebro. Aqui ocorre um fenômeno onde se equivalem os seres, independente de seus estudos, leituras, vivências e preparos. É quando não se distingue um PHD do porteiro semi analfabeto, porque ambos reagem baseados em instintos que não controlamos e que nos são inatos, porque são necessários para a sobrevivência, destacadamente em casos onde estamos sendo agredidos ou na iminência de sofrer algo físico.

Atualizando o tema em 06/03, são 8 os casos conhecidos de Coronavírus no Brasil. Hoje saiu a notícia que irão cancelar o salão do automóvel em SP neste ano. Estima-se a perda de mais de 320 milhões na cidade que seriam gerados por este grande evento com turismo, restaurantes, hotéis, transportes, comércio e taxas. Esse evento gera 30 mil empregos temporários.

Eu entendo perfeitamente os receios que levaram essas empresas a tomar essa decisão extrema. Prevenir é sempre mais barato e recomendado do que remediar. O efeito devastador deste vírus, em perspectiva contra outras doenças ainda é algo a ser constatado. A recessão que virá se estas atitudes se tornarem cotidianas não, estamos entrando numa profecia autorrealizável.

 

Nuno Figueiredo

Engenheiro Eletrônico formado pela Mauá, MBA em Gestão Empresarial pela FGV, é um dos fundadores da Signa, onde atua desde 95. Entre outros defeitos, jogou rúgbi na faculdade, pratica boxe e torce pelo Palmeiras.

 

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