Os dados não mentem

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Henri Coelho

02 de jun de 2020

· 6 min de leitura

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Os dados não mentem, mas sob tortura eles confessam o que você quiser ouvir.

Nos últimos anos comecei a ouvir alguns podcasts de forma regular. Escolhi alguns poucos que conseguia acompanhar diariamente ou semanalmente e virei fã de alguns deles, que praticamente não deixava de ouvir.

Pra citar dois que mais frequentemente ouvia e que são ótimas pedidas para quem quer se aventurar neste universo, cito O Assunto, com Renata Lo Prete, e Mamilos, com Ju Wallauer & Cris Bartis. O primeiro é diário, sempre aprofundando um assunto mais fresco no noticiário e o segundo, semanal, disseca temas mais difíceis, numa pegada mais de construir o diálogo entre os participantes, mesmo que estes sejam de espectros opostos.

O local preferido para escutá-los sempre foi o carro, principalmente no trânsito diário de ida e volta do trabalho. Confesso que, depois do início da pandemia no Brasil, e com o trabalho agora sendo desenvolvido em Home Office, não estou conseguindo ouvir muito nestas últimas semanas.

E às vezes, algumas frases que você escuta, ficam na sua memória. Ouvindo um dos episódios do Mamilos, uma das apresentadoras, a Ju, disse a frase que está no início deste texto, e que nunca mais saiu da minha cabeça.

E hoje, isto novamente veio a mente, quando fui explorar um site que acho fantástico, chamado "Our world in data". Eles criaram uma seção excepcional sobre o Coronavírus, que nos ajuda muito a lançar luz sobre os números de diferentes países, mesmo considerando sub-notificação em lote e países que não expõem muito seus dados, mas trabalham muito bem com aquilo que tem à disposição. O site é este: ourworldindata.org/coronavirus.

Além disso colocam vários controles nas mãos dos usuários, de forma que você consiga explorar os gráficos como quiser. Na imagem a seguir destaco vários controles em amarelo, para que qualquer pessoa possa entrar e escolher a forma como as informações são mostradas nos gráficos, além de poder ver os números como um pequeno filme, baixar os dados para Excel, etc.

Na parte das métricas, você pode ver por mortes confirmadas, casos confirmados ou testes realizados. Na frequência, olhar pelo total acumulado ou pelos dados diários. Pode ainda mostrar os dados absolutos ou por milhões de pessoas. Na linha do tempo, pode alinhar para que todas as curvas comecem quando os países confirmaram 5 mortes diárias pela primeira vez ou pelo calendário regular.

Finalmente, nos controles superiores, você pode mostrar os dados reais ou suavizar mostrando uma média dos últimos 3 ou 7 dias. No caso da frequência total e não diária, esta suavização não é tão relevante. Mas quando se fala de casos diários, ela ajuda bem a entender melhor o gráfico.

Do lado esquerdo você pode adicionar ou remover países do gráfico, de forma que você possa comparar os países que te interessam. No gráfico você pode visualizar em escala linear, a que estamos mais acostumados a ver, ou escala logarítmica, além de poder controlar o eixo de datas para mostrar períodos maiores ou menores no caso de estar usando calendário.

Numa explicação muito rápida e imprecisa, na escala linear cada caso ocupa o mesmo espaço no gráfico, não importa se ele esteja entre o primeiro e décimo caso ou entre o nonagésimo e centésimo caso. No caso da escala logarítmica o espaço ocupado entre 1 e 10 casos é o mesmo espaço ocupado entre 11 e 100 caso e entre 101 e 1000 casos. Ela serve melhor para olhar algumas informações de tendências. Minha sugestão é que você possa usar o link acima e verificar como estes controles podem ser usados.

No gráfico exposto mais acima é fácil notar a curva de crescimento do número de mortes no Brasil, com a tendência de que, em menos de 2 semanas, sejamos o segundo país do mundo em número de mortes, ultrapassando Reino Unido, Itália e França, cujas curvas não têm a mesma inclinação.

E exponho abaixo outros 3 gráficos que obtive hoje a partir desta ferramenta. O primeiro gráfico mostra, em escala linear, a regra dos últimos 7 dias para o número de mortes diárias dos países selecionados, considerando o número de dias, desde que cada país informou, pela primeira vez, o número de 5 mortes diárias:

O segundo mostra as mesmas informações, em escala logarítmica. Notem, como diferença entre elas, que fica mais acentuado o crescimento da realidade na Índia e Argentina, que são mais difíceis de serem vistas no primeiro caso.

No caso do Brasil, os dois gráficos mostram a mesma tendência de crescimento em números absolutos.

Mas e se compararmos por milhão de habitantes, como o Presidente da República falou recentemente? Neste caso faz mais sentido olharmos o total de mortes e não o número de mortes diárias, sem a suavização dos últimos 7 dias. Usei ainda a possibilidade de ver um filme, cujo último quadro, o mais atual, mostra a situação abaixo.

Claramente estamos muito abaixo de vários outros países, até da Bélgica que mal aparecia nos gráficos anteriores e que tem proporcionalmente mais de 6 vezes mais mortes que o Brasil.

Por um lado, fica muito claro o crescimento das mortes nacionais e por que somos chamados de novo epicentro mundial da pandemia, lembrando que antes do Brasil este “título” foi dado para a China, depois para a Itália, e depois para os Estados Unidos. Por outro lado, mostra que, como nossa população é maior do que vários países, não temos um número de mortes, por milhão, tão grande como nestes países.

Então não temos que nos preocupar. É só exagero da imprensa, que só mostra o lado ruim e que lhe interessa, certo? Ou na verdade temos que olhar mais a fundo, pois nossos números não param de crescer e certamente passaremos os países em números absolutos? E se realmente a curva se comportar como ocorreu nestes países, demorando mais para descer do que para subir, também os ultrapassaremos em números relativos?

Por isto que a frase que abre o texto não sai da minha cabeça. Bem formatados você pode achar a explicação que quer nos números.

 

Henri Coelho

Sou fundador da Signa, casado e pai de um casal de filhos que saíram melhor que a encomenda. Já nasci corinthiano, gosto muito de futebol, vôlei e xadrez, também de matemática. Podem torcer o nariz.

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Ultimos comentários

Marcos Jatobá

Análise mais que interessante. Recomendo a leitura.