O impacto do 5G no roubo de cargas

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Nuno Figueiredo

13 de ago de 2019

· 8 min de leitura

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5G
roubo de cargas
segurança
gerenciamento de risco
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Há alguns anos fiz uma visita comercial numa transportador no Rio de Janeiro. Era, e ainda é, uma transportadora tradicional, fundada há vários anos. Fui atendido por um dos donos, expoente da segunda geração da empresa.

Parecia uma empresa fantasma. O lugar era amplo, mas não havia nenhum funcionário, só o dono. Ele, percebendo minha surpresa, me confidenciou que a empresa passava por sérias dificuldades, mas manifestou sua confiança que iria superar as adversidades.

– A gente verga, mas não quebra – disse ele.

Nem começamos a conversa, ele recebe um telefonema desagradável. Estava sendo ameaçado de morte. Foi fácil entender isso porque ele soltou algo como:

– Não adianta você mandar me matar, aí você não recebe. A gente vai te pagar. Eu sei quem você é, e não sou louco de não te pagar.

Desligando o telefone ele me contou a origem de seus problemas: tiveram dois roubos sucessivos de carga. A seguradora cancelou a apólice de seguro e ele não tinha como atender um de seus maiores clientes. Desesperado, contratou um serviço de escolta privada feita por pessoas que entendem mais de extraviar a carga do que garantir a segurança da mesma.

É fácil criticar que, quem se mete com bandido, vai colher o que planta, mas eu realmente entendo o desespero de um empreendedor que está numa luta ingrata para continuar rodando. A segurança é algo que o estado deveria prover. O sócio governo, além de não fazer a sua obrigação, não abre mão de cobrar os impostos.

Isto foi há mais de 15 anos. De lá para cá a situação só piorou. É cada vez mais alta a conta para o transporte de cargas de alto valor agregado.

E as taxas vão se acumulando. Começou com o Ad Valorem, que é um percentual sobre o valor da mercadoria transportada. Esta taxa deveria cobrir a despesa com o seguro. O Ad Valorem começou sendo um percentual direto. Hoje há casos onde o percentual varia por faixa de valor, e quanto mais cara a faixa, maior o percentual. Há casos onde ele varia por faixa de distâncias e finalmente há casos onde ele varia pelo trecho transportado, não sendo possível ter um percentual único.

Aí vem o GRIS, taxa criada para custear o Gerenciamento de Risco. As apólices de seguro, dependendo do tipo de mercadoria transportada, agregam uma série de exigências, como: o veículo tem que ser rastreado, há necessidade de monitoramento por uma central que funcione 24 x 7, pode haver exigência de deslocamento em comboio em alguns casos, ou de uso de escolta se o valor da mercadoria for mais alto, ou de rodar por uma rota previamente determinada, com paradas permitidas somente em pontos definidos e conhecidos, e por aí vai.

Hoje é fácil achar veículos que possuem mais de um rastreador, tem casos onde há 3 rastreadores atuando simultaneamente.

E aparecem as zonas onde não há entrega. Até os correios fazem isso, dependendo do local da entrega você tem que retirar na agência mais próxima porque a entrega não vai até lá, pela simples questão que o risco não compensa.

Se por um lado não há boas notícias no lado do risco, no lado da averbação as coisas mudaram muito, mas nem tudo para melhor. Antes era produzido um relatório sobre o mês vencido e o mesmo era enviado para a seguradora para o cálculo do valor a pagar. O risco de glosa de um sinistro era baixo, já que não havia a necessidade de previamente averbar a mercadoria.

Era muito difícil para a seguradora auditar e garantir que todos os transportes tinham sido averbados. Como não há almoço grátis, essa incerteza certamente já estava calculada no preço do seguro.

Hoje a averbação é feita em tempo real, e ocorre antes do transporte ser iniciado. Tudo é on line e automático, mas há sempre o risco de na hora do vamos ver, descobrir que houve algum problema na averbação, e, portanto, a carga não estava segurada.

O simples processo de averbar passou a ser um risco adicional para o transportador, porque é deste a conta se algo não fluir conforme o esperado.

Segundo a CNT, em 2018 tivemos a bagatela de 22 mil ataques a motoristas. Os prejuízos são estimados em R$ 2 bilhões. É muito dinheiro perdido por conta do crime.

Se você vende ou transporta produtos de alto valor agregado, o CD já tem que ter uma estrutura antifurto muito bem montada, com um bom esquema de segurança. Isso também é custo, mas sem dúvida o gargalo e ponto mais vulnerável é o transporte.

Tanta dificuldade se torna uma oportunidade para estruturas que fizerem os investimentos necessários e por isso, passam a buscar justamente aqueles fretes que outros não querem devido ao alto risco.

Um ponto que ainda está numa zona cinzenta é o monitoramento ativo de frotas, usando rastreadores e/ou soluções complementares, como APP Mobile.

Para a questão logística funciona bem, porém para requisitos de risco a coisa ainda precisa evoluir muito, não por deficiência dos atuais fornecedores, mas por questões de infraestrutura.

Por mais legal que seja o discurso das operadoras de telefonia, a comunicação não é confiável. Há muita perda de conexão, e muitas áreas de sombra – como são conhecidas as áreas onde a comunicação de dados ou voz do celular não funciona. Sem uma comunicação totalmente estável, não há como fazer um monitoramento eficaz.

Por exemplo, quando um veículo fica sem sinal, isto é, a comunicação do rastreador para a central é interrompida, não há como saber se é uma situação de risco, como um roubo, ou se o veículo entrou numa zona de sombra. Você não consegue acionar atuadores remotamente sem sinal. Também não dá para enviar comandos de bloqueio de combustível e disparo de sirene sem ter certeza.

Estes eventos, se fossem raros, daria para ter algum contorno via procedimentos manuais, como é praxe nesse caso, como alguém da central de monitoramento entrar em contato com o motorista, via ligação para o celular dele, e confirmar se há ou não algo com o que se preocupar.

Por questões econômicas, é normal ter um operador nessa central olhando 80 ou até 100 veículos ao mesmo tempo. Algoritmos de inteligência artificial podem atuar ajudando a selecionar os casos onde é necessária a intervenção ou um olhar humano. Isto permite um duplo benefício: aumentar o número de veículos vigiados por um único operador e ainda melhorar a qualidade e eficácia do monitoramento, via automação, que inibe ou minora o erro humano.

Ainda que isso seja verdadeiro, o gargalo da falha de comunicação por áreas de sombra é um fator extremamente limitante. Em termos de soluções tecnológicas chegou-se numa barreira difícil de transpor, porque o limite é das comunicações disponíveis, não dos hardwares ou softwares envolvidos.

Para deixar bem claro, eu não estou afirmando que o monitoramento de frotas é inútil ou ineficaz, mas sim que ele tem deficiências que não o permitem ser mais eficaz e mais barato. Ele ajuda muito mais do que atrapalha. Se ele não atende plenamente, sem ele fica muito pior.

Tanto é assim que a maioria dos planos de gestão de risco exige para o transporte de cargas mais visadas o uso de rastreadores, e de uma central de monitoramento.

O recente roubo milionário de ouro no aeroporto de Guarulhos é uma prova que é difícil garantir que algo não seja roubado. Eles levaram uma carga avaliada em R$ 100 milhões.

A iminente chegada da quinta geração de telefonia celular, o 5G, será um divisor de águas. Ao remover o sarrafo da falha de comunicação permitirá um nível antes impossível de monitoramento automático.

Essa automação inibirá erros ou desvios do motorista, até que se chegue na solução ideal, que será um robô monitorando um veículo autônomo, também dirigido por outro robô. Nesta situação o controle será pleno.

Não digo que isso vai evitar roubos, mas não haverá dúvidas a respeito de quando essa situação ocorre e o acionamento da polícia, bem como dos atuadores no veículo será imediata, tornando a atividade mais segura.

A chegada do 5G permitirá uma redução significativa do custo total gasto com segurança e isto, por consequência, irá reduzir o custo do seguro. E como são tecnologias de alto impacto, devem vir para o mercado como um todo. Fora uma largada inicial, a disseminação tende a permitir que diferentes players operem com o mesmo nível de serviço, viabilizando uma maior competição no transporte de alto valor agregado.

E se você pensa que isto ainda está longe, dá uma olhada nesta matéria do Olhar Digital: “Brasil se prepara para receber o maior leilão de 5G do mundo”.

O 5G é condição para o uso disseminado dos veículos autônomos. Tanto o 5G como o uso de veículos autônomos é um futuro certo, porém sem data precisa. Como Shakespeare já dizia, em Macbeth:

“If you can look into the seeds of time, and say which grain will grow and which will not, speak then to me”.

"Se você puder ver as sementes do tempo e saber que grãos irão crescer e aqueles que não se desenvolverão, diga para mim".

 

Nuno Figueiredo

Engenheiro Eletrônico formado pela Mauá, MBA em Gestão Empresarial pela FGV, é um dos fundadores da Signa, onde atua desde 95. Entre outros defeitos, jogou rúgbi na faculdade, pratica boxe e torce pelo Palmeiras.

 

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Ultimos comentários

Denise Tucciarelli

Triste realidade. Que a luz no fim do túnel (5G) possa se manter acesa quando chegar.