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O que você perguntaria ao Criador se tivesse essa oportunidade? Bom, eu não sei o que perguntar a Deus, mas o Bill Gates disse que a pergunta dele seria “Como funciona o cérebro?”. Nosso complexo e ainda pouco decifrado computador pessoal realmente é uma máquina poderosa, cujo funcionamento ainda não é tão claro.
O melhor embate entre o cérebro humano e o computador ocorreu no desafio entre o campeão mundial de xadrez Garry Kasparov e o Deep Blue, o grande computador da IBM.
Neste desafio, Kasparov ganhou o primeiro e perdeu o segundo torneio, sendo esta, a primeira vez que um campeão mundial de xadrez perdeu para um computador, em 1997. Esse desafio rendeu um filme e muitas acusações de manipulação foram feitas. A desconfiança ficou maior quando a IBM se recusou a conceder uma revanche, estando, portanto, a disputa encerrada com um empate.
Um jogo de xadrez sintetiza bem o duelo entre um cérebro e um computador. Certamente o computador consegue processar mais rápido e ainda consegue simular muito mais possibilidades, porém um Kasparov, com um número mais limitado de opções, consegue selecionar os melhores caminhos e ficar com a meia dúzia de hipóteses mais promissoras. E ele pode usar a criatividade, algo ainda impossível para um computador.
O tema tem um valor agregado quando se pretende fazer uma simples pergunta: pode um computador fazer um trabalho melhor que um Kasparov? Eu gosto de jogar xadrez, mas o meu interesse não é sob o ponto de vista de um jogo e sim na vida real e prática. Pode um programa trabalhar melhor que um profissional experiente e tarimbado?
Um planejamento feito por uma máquina pode ser melhor do que aquele feito por alguém experiente que lida com o tema há mais de 20 anos? Se isto não for verdadeiro, coloca-se em dúvida se vale ou não a pena investir, por exemplo, numa solução de roteirização. Como medir os resultados que podem ser obtidos pelo sistema em comparação com o experiente Kasparov, da expedição que faz isso há muitos anos e com um grau bem aceitável de desempenho?
Um sistema é melhor que uma pessoa quando a tarefa é repetitiva ou demorada e ainda, quando há grandes volumes envolvidos, porque o ganho em termos de tempo torna o resultado palpável. Ainda assim, existem tarefas em que simplesmente não parece valer a pena o esforço e custo necessário para substituir algo que funciona bem. Os programas atuais ainda estão muito longe de tomar decisões, e ainda há muito espaço para o Kasparov atuar no mundo corporativo.
E sem dúvida um sistema, seja ele qual for, só vai ser mais eficiente se a sua concepção e evoluções forem avaliadas e reformuladas pelos Kasparovs de plantão. A busca de eficiência requer esforço contínuo de aprimorar os algoritmos para que a máquina, enfim, faça um trabalho melhor que o Kasparov.
Na verdade, a máquina apenas processa aquilo que alguém planejou e programou como sendo a melhor opção para um determinado caso. A máquina é um robô obediente e faz simplesmente aquilo que lhe foi determinado, sempre da mesma forma, sem se cansar, precisar dormir, ficar estressado ou desmotivado pela falta de títulos no ano do centenário.
Acredito que dificilmente a máquina substituirá o Kasparov. Pelo menos não vejo isto nos próximos 10 anos e não me atrevo a pensar num horizonte de tempo maior que este ao afirmar isto, mas certamente a máquina substitui e continuará eliminando aqueles postos de trabalho, cuja tarefa é repetitiva e sem muita capacidade de análise, e que pode ser feita por qualquer aprendiz de xadrez, deixando para o mestre apenas os grandes desafios.
O negócio é torcer para que Deus responda para o Bill. E tomara que ele nos conte, para enfim, termos um derradeiro check mate.
Nuno Figueiredo
Engenheiro Eletrônico formado pela Mauá, MBA em Gestão Empresarial pela FGV, é um dos fundadores da Signa, onde atua desde 95. Entre outros defeitos, jogou rúgbi na faculdade, pratica boxe e torce pelo Palmeiras.
Foto: Freepik
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